quinta-feira, 11 de agosto de 2005

Feitiço vira-se contra o feiticeiro

As polícias, os militares de todos os ramos das Forças Armadas e os funcionários da Administração Pública estão a protestar contra as medidas que o governo aprovou e que apenas estão dependentes da assinatura do presidente da República para poderem entrar em vigor. Na prática, os trabalhadores (cerca de 650 mil) que têm como entidade patronal o Estado estão preocupados com o rumo de gestão que o patrão – Governo Central - está a pôr em acção e que dizem não oferecer garantias de sustentabilidade.
Em circunstâncias semelhantes, os trabalhadores do sector privado temiam pela falência e inclusive pelo encerramento das empresas o que infelizmente tem acontecido no nosso país. O patrão Estado não vai à falência, não fecha as portas, nem os governantes da República são julgados pela má gestão que eventualmente possam fazer no exercício de funções, salvo em caso de alegada corrupção ou algo parecido.
É a grande diferença entre os sectores público e privado. A má gestão que eventualmente possa acontecer na actividade privada é regra geral fortemente penalizada, cujas consequências são bem conhecidas. Na actividade pública, dependente da administração central, cometem-se as piores decisões com custos irreparáveis para o País e nada acontece. Saem uns, entram outros, voltam a sair, voltam a entrar, rotativamente, sem que haja reposições, antes compensações.
Somos contra as greves por dá cá aquela palha. Particularmente quando são levadas a efeito por forças políticas encapotadas por sindicatos que procuram tirar proveito, em qualquer momento, do descontentamento dos trabalhadores para derrubarem o partido que está no poder. Tem sido muito usual em Portugal ver os partidos da esquerda, incluindo o partido socialista, envolvidos nas manifestações contra os governos que não tenham as suas cores partidárias. Temos visto, nestes últimos trinta anos de regime democrático, os socialistas e comunistas de braço-dado nas manifestações contra o poder, erguendo bandeiras dos partidos, slogans e toda o marketing de campanha para derrubar governos, muitas das vezes num nítido aproveitamento do descontentamento dos trabalhadores.
Nestas últimas semanas, o que temos vistos, são os trabalhadores de toda a Administração Pública, incluindo as Polícias e as Forças Armadas, a protestar publicamente contra o governo que está no poder e que é do Partido Socialista. O feitiço vira-se contra o feiticeiro. O governo socialista vê-se confrontado com uma situação de luta dos trabalhadores que tantas vezes os incitou a manifestarem-se contra os governos do PSD e PSD/PP.
Os socialistas e os comunistas criaram, alimentaram e fomentaram, de qualquer forma e feitio, durante anos, as manifestações só com o intuito de porem em causa e até derrubar quem estava no poder. Os socialistas vêem agora o resultado dos seus ensinamentos. Não está em causa o direito às reivindicações nem o direito à greve que consta desta democracia portuguesa. Se não concordamos temos o direito de manifestar o nosso descontentamento.
As manifestações de protesto que temos visto ultimamente contra o governo da República – governo socialista – revelam outra maturidade e civismo dos seus intérpretes. E é assim que deve ser. Um não à instrumentalização partidária, mesmo que possa haver tentações para confundir e aproveitar-se da luta em marcha. Os trabalhadores portugueses têm cabeça para pensar e pés para andar. Não precisam dos partidos de esquerda e dos socialistas, nem de quaisquer outros, para protestar nem para defender os seus direitos.
O povo em geral deve manifestar o seu descontentamento sempre e quando vê que estão a ser afectado e desconsiderado nos seus direitos. Não deve curvar-se às decisões pura e simplesmente nem deixar-se ficar calado só porque o governo Central entende tomar medidas invocando razões que podem não ser as mais justas e, infelizmente, muitas têm sido, de tal modo impróprias e injustas que apenas têm agravado a situação do país, aos mais diversos níveis.
Quando dizemos que”o feitiço vira-se contra o feiticeiro” é com base do que sempre foi prática corrente em Portugal. Foram os partidos de esquerda e os socialistas os que mais “usaram e abusaram” do mal-estar dos trabalhadores para levá-los para greves muitas das quais podiam ter sido evitadas e os desfechos terem sido mais favoráveis aos trabalhadores. Uma das bandeiras que mais “gozo” sempre deu aos comunistas e aos socialistas portugueses foi a de conseguirem promover e mobilizar greves contra os poderes governamentais, autárquicos e outros que não fossem das suas ideologias partidárias.
O que está a acontecer no momento presente com as manifestações da função pública, revela maturidade. Discordar com civismo e argumentação válida e própria. Sem decalcar “ordens” da esquerda nem embandeirar em arco pelo facto de haver liberdade para reivindicar. Discordar não é zangar-se nem fazer chicana política na praça pública.

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