quinta-feira, 23 de junho de 2005

Greves telecomandadas

Sempre me custou aceitar as manifestações, as greves e a censura à livre opinião. São actos legítimos e ao mesmo tempo contraditórios. A greve é um direito que a todos assiste mas custa-me a aceitar a forma e o modo como é manifestada e, principalmente quando realizadas por organizações de defesa do Estado. Os manifestantes apresentam-se e falam em tom de agressividade, chamam os nomes que bem entendem aos governantes, ameaçam tomar posições mais duras, entoam em alto e bom som slogans previamente elaborados, desde “mentirosos” a “aldrabões”, acabando sempre com o “disco” comunista que tem a letra do “povo unido jamais será vencido”.
Nos tempos da censura a figura alvo era contestada mas sempre dentro dos limites previamente estabelecidos. A liberdade era inexistente e quem não tivesse habilidade para dar o tom à medida da orquestra estava liquidado. Mas nem por isso deixou de haver contestações no regime ditatorial. A manifestação é que era mais circunscrita, mas intelectualizada, com uma perspicácia mais apurada e as intervenções porventura mais contundentes que deixavam em polvorosa as forças governamentais.
Nestas últimas semanas temos visto, pela televisão, algumas manifestações e, num plano geral, com o devido respeito por alguns que integram os cortejos grevistas, mais parece um “arrastão” de desordeiros que se concentram para protestar contra o Governo. A legitimidade não deve ser posta em causa mas pensamos que, passados 31 anos do golpe revolucionário de Abril de 1974, já haverá outras formas de manifestação grevista sem o recurso a todo aquele aparato que leva milhares de pessoas para as ruas. O país pode estar pobre em relação à média europeia mas não está em revolução à moda dos primeiros tempos do regime democrático em Portugal.
Há 31 anos quase que nem governantes haviam para dialogar. Os ministros saíam e entravam nos governos sem os portugueses terem tempo de memorizar o nome. A revolução de Abril de 1974, a repetir-se, eventualmente nos dias de hoje, nunca teria sucesso com o mesmo modelo de manifestação apresentado nessa altura. “Todos à molhada” não tem cabimento nos dias de hoje e os números de adesão confirmam isso mesmo.
Que efeitos tem uma greve com 40 ou 50 mil funcionários públicos se há cerca de 700 mil trabalhadores na Função Pública? Depois constata-se que há uma certa adesão de “fazer por fazer”, de mostrar que também “faço greve” ou então pelo simples facto de gostarem de andar à “molhada”.
Não temos dúvidas que se o PCP tivesse conseguido a desejada coligação com o PS, as greves que estão a aparecer alguma vez teriam ido em frente. A zanga PCP-PS (tão amigos que eles eram) pode manifestar-se de várias formas. As manifestações grevistas são uma delas. Já sabemos que os sindicatos e as centrais sindicais dizem que as greves não têm nada a ver com partidos políticos. Os comunistas dizem que não estão metidos no “baralho” e tudo aquilo que os sindicatos fazem está completamente fora de qualquer partido político. Uma mentira facilmente detectada.
Não sou contra as greves mas custa-me a aceitar determinados argumentos que são apresentados como razão para fazer greve. Desde muito novo que aprendi que trabalhar não é ser empregado e que quem paga o ordenado tem sempre razão! Se há motivos para estar em discordância há que insistir na via do diálogo, há que trabalhar empenhadamente no sentido de ser encontrada uma saída para os assuntos em litígio, há que dar uma explicação cabal do que está a acontecer.
Mobilizar as pessoas para uma ou muitas manifestações públicas, em percursos pelas ruas, é relativamente fácil. Mas o mais importante é debater, até a exaustão, os problemas, levar as pessoas a participar em reuniões, até ser encontrada a medida ou medidas mais certas para expor às entidades governamentais. Não é com manifestações iguais aquelas que estão a ser feitas nas últimas semanas que o Governo vai mudar de posição. Talvez até, quem sabe, este tido de reacção de contestação esteja a ser favorável às posições totalitárias que o Governo PS está a tomar.
Por fim, repare-se no discurso do “pobre e do coitadinho” que o Governo está a fazer.
É uma vergonha.
Tudo colocado ao mais baixo nível do impossível, do país empobrecido e endividado, para justificar as medidas que o Governo socialista pretende e está a tomar. Assim, como as coisas estão a decorrer, o Eng. José Sócrates, mantendo o discurso do embuste pré-eleitoral, deixa de ser mentiroso. Prometeu, é certo, não aumentar os impostos, mas aumentou. Prometeu rever o Código de Trabalho e dar a dignidade merecida aos trabalhadores, mas está a agravar a vida de quem trabalha. Prometeu o céu mas está a conduzir a esmagadora maioria dos portugueses para um inferno terreno.
O Governo está a deitar abaixo direitos adquiridos pelos trabalhadores durante toda a vida, desde a idade da reforma, tempo de serviço, carreiras de função e outros bens consagrados à data em que os trabalhadores começaram a exercer funções. Isto é que é um “crime”. E são sobre estas e outras questões importantíssimas que o debate deve ser feito, maduramente, antes de apressadamente se promover greves e manifestações que acabam por nada alterar.
Uma greve só faz efeito quanto todos aderem à greve. Quando leva o país a parar e o Governo a ficar impossibilitado de governar.
Greves de fachada não dão nada. Mais ainda quando são sempre os mesmos que andam de megafone na mão e atrás de si bandeiras vermelhas. Assim, este ou outro qualquer governo dorme descansado. Assim não dá! Greves como as que estão a decorrer reforçam ainda mais a posição totalitária do governo socialista. São greves telecomandadas, à boa maneira dos comunistas.

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