quinta-feira, 28 de outubro de 2004

O “aborto” ou a “pena de morte” vão eleger o presidente dos EUA

Qual delas a pior! A “morte” está em ambas as situações. Mas, ao que tudo indica, são estes “dois crimes” que estão a fazer pender o prato da balança para a eleição do presidente dos EUA, na próxima terça-feira, 2 de Novembro. Os eleitores norte-americanos parecem estar divididos entre quem defende o aborto (Kerry), ainda que de forma não muito esclarecedora, e quem defende a pena de morte (Bush), quando a justiça entender ser este o desfecho a dar.
E por aquilo que temos acompanhado, o aborto e a pena de morte estão a criar ondas enormes de adesão e de contestação. Já há quem diga que é um destes “crimes” que vai decidir quem será o próximo presidente dos EUA. O eleitor americano não é de ir atrás de promessas que pouco ou nada dizem de concreto. Não há partidos e políticos do género que vamos encontrar em Portugal que passam o tempo a dizer mal e a fazer promessas inviáveis. As coisas têm de ser claras e o compromisso tem que ser assumido sobre factos concretos.
O respeito político nos EUA é enorme e nunca vemos os políticos num debate televisivo ou na rádio a se ofenderem. Os políticos americanos não ganham eleições a dizer mal dos seus adversários, ganham pelos propostas e compromissos que assumem. O aborto e a pena de morte são actos concretos. A guerra do Iraque e outras guerras que atravessaram o mandato de George W. Bush foram comentadas mas nunca valorizadas ao ponto de porem em xeque o actual presidente.
Outra realidade que as eleições nos Estados Unidos (EUA) estão a mostrar é como funciona o apelo ao nacionalismo. A bandeira americana produz um efeito emocional nos americanos como em nenhum outro país, outros povos. Há um sentimento profundo à volta da bandeira, do hino, da Pátria, dos valores da Nação, unindo todos à volta de um querer que faz dos EUA um país líder dentro e fora das suas fronteiras.
Não digo que os portugueses não têm sentimentos para com Pátria e respeito pela bandeira, mas não vejo aquela paixão consciente de quanto representa a bandeira e os valores pátrios. Durante toda a minha vida ( e já lá vão 60 primaveras!) apenas em escassas ocasiões vi manifestações colectivas de sentimento pátrio: na guerra em África, vi jovens militares cheios de lágrimas, em momentos de dor, quando a bandeira nacional era içada e o hino nacional ecoava a enunciação dos que tombaram na mata, naquele momento, é como se a bandeira e o hino tomassem o lugar vago deixado por aquele “camarada” que partiu sem ter tempo para se despedir; por ocasião de feitos históricos alcançados no plano desportivo, nomeadamente em competições olimpicas e, muito recentemente, com o fantástico efeito das bandeiras por ocasião do campeonato europeu de futebol.
O povo americano cultiva a paz e está permanentemente optimista. Os fados e as desgraças são sempre coisas passadas que não vão impossibilitar que o amanhã seja melhor. Há um realismo que surpreende os europeus mas que não deixa de ter algum fundamento. “A paz faz-se com a guerra”. Em Portugal, Mário Soares chegou a defender o diálogo com a organização terrorista al-Qaeda como forma de acabar com a violência. Um Mário Soares sonhador, teórico e possivelmente já perdido nas andanças do mundo actual.
Por outro lado, os americanos têm um ilimitado orgulho do seu país, dos seus governantes. Não precisam de um acontecimento raro para terem em casa a bandeira do seu país, cantarem o hino ou participar em jornadas cívicas em prol do engrandecimento da Nação. É um povo que, em hábitos e costumes, na visão pelo mundo, nada têm a haver com o pessimismo e maldizer da maioria dos povos europeus, entre os quais os portugueses. Senão vejamos, alguns contrastes.
Não há em Portugal uma rua ou praça com o nome “Portugal”, mas ruas e praças com nomes de países estrangeiros há muitas. Vemos em Portugal uma “Praça de Espanha” mas não vimos em Espanha uma “Praça de Portugal”. Na própria Espanha, em várias cidades, várias “Praças de Espanha”. Se estivermos nos EUA, sem darmos por isso, estamos a passar numa rua com o nome da cidade,nome de outros Estados e de muitas outras referências ao próprio país.
É este o sentimento expressivo dos norte-americanos. Sem que sejam profundamente influenciados pelas campanhas eleitorais. Os americanos votam naquilo que é concreto. E a poucos dias do acto eleitoral, o aborto e a pena de morte estão a dividir os eleitores e será com um forte pendor sobre estes dois crimes que o novo presidente dos EUA será eleito!

quinta-feira, 21 de outubro de 2004

Os patetas vaidosos

Sem cerimónia digo que a comunicação social em Portugal é, em grande parte, culpada do atraso cultural de que tanto se fala. Não me refiro apenas às muitas calinadas do português, porque aceito a máxima que diz “só não comete erros quem não trabalha”, mas a um narcisismo patético e por vezes estúpido que nos leva a ter saudades de uma outra comunicação social, que não do antigo regime, mais séria, mais interventiva e mais rigorosa em tudo quanto abordava e transmitia para a opinião pública.
Quando vejo alguma comunicação social relevar quem perde e desvalorizar quem ganha não posso deixar de pensar, nem eu nem ninguém de bom senso, que os valores devem estar invertidos e empobrecidos. Assim procedendo, os objectivos da comunicação social mais parecem empenhados em menosprezar as vitórias, opor-se ao desenvolvimento e apoiar os reinos da pobreza cultural e da miséria social.
Não é este, de modo algum, o papel da comunicação social. E é vasta a biblioteca sobre os mass media para se perceber que a informação não é para os néscios, para os tolos nem para intocáveis. Não é para quem quer mas para quem possui abalizados conhecimentos de como funciona a sociedade no seu todo.
Tenho o vício, confesso, de ler jornais e revistas de outros países e até das diferentes regiões de Portugal. Um vício que sei ser também de outras pessoas. Tenho uma antiga tendência para ver nos jornais e revistas as janelas dessas regiões e países, um espaço por onde posso perscrutar a sociedade do lugar nos seus múltiplos aspectos.
Vejo nesses jornais (estrangeiros) uma informação o mais completa possível sobre o tema tratado, sem tomar partido, respeitando os prós e contras, apenas com a preocupação de levar para os leitores o que se passou ou vai acontecer.
Estes jornais são respeitados e são muito lidos. Não se escondem atrás de chavões nem se deixam maquilhar por bugigangas de ocasião. Os directores, jornalistas e fotógrafos, são conhecidos e muito respeitados, procuram estabelecer um convívio permanente com a sociedade e não tomam posições a favor ou a desfavor. Sabem os leitores que o que vem nos jornais é o que se passou. Não há choques nem abusos. Há respeito entre todos.
Esta dignidade da comunicação social viu-se em Portugal, noutros tempos, que não antes de 74. Não sei como funcionam as redacções dos diários, nem como é feita a gestão das notícias. Mas também não é isso que interessa-me enquanto leitor. O que vejo é que há muito amadorismo a reportar-se sobre assuntos de grande Pode-se discordar e devemos discordar, é salutar e devemos cultivar e defender as responsabilidade e de exigência profissional que a sociedade vai criando no dia a dia.
nossas posições, mas fundamentando-as e, se não concordamos, apontando claramente os erros e sempre que possível avançando com alternativas. Se o jornalista não quer ser uma caixa de ressonância (nem nunca deve ser) deve saber respeitar quem está à sua frente. O maior pecado do jornalista é quando está convencido que sabe de tudo e pior
ainda quando encara as conferências de imprensa como um simples debitar de palavras.


Não concordo, de modo algum, que haja jornalistas em conferências de imprensa (como a que decorreu na sede do PSD, na noite das eleições) sem um profundo conhecimento sobre o que representa uma vitória eleitoral. Que revelam desconhecer o que são os momentos emotivos que se seguem aos resultados eleitorais e que não estejam preparados para com isenção e postura profissional questionar com objectividade.
Depois ficam amuados, criam tropeções, clamam por protecção e passam a ser heróis por um dia! Nem dão conta que o líder do PSD, Dr. Alberto João Jardim, tem um currículo invejável na democracia europeia, que é o político com mais vitórias sucessivas na Europa comunitária, que tem mais-valias enaltecidas por adversários políticos de craveira que são os primeiros a reconhecer as suas inegáveis qualidades.
Quando a comunicação social, através dalguns dos seus jornalistas, comete falhas que são de todo incompreensíveis, dando destaque a quem perde e desvalorizando quem ganha, está a prestar um mau serviço. A não contribuir para que a sociedade possa evoluir. Desconhecer ou não respeitar esta realidade, desconsiderar os currículos dos vencedores, é ser pateta, estúpido.

quinta-feira, 14 de outubro de 2004

Liechtenstein depois da Madeira

Dias antes do jogo de futebol entre Portugal e a Rússia, tinha dito aos meus amigos que o Liechtenstein, com apenas 33 mil habitantes, tinha mostrado que Portugal, o país mais antigo da Europa, com mais de 10 milhões de habitantes, padecia de uma doença chamada melancolia saloia. Porque parece haver uma inexplicável apatia em momentos de nada perder e quando todos, inclusive os nossos adversários, reconhecem que não têm as mínimas hipóteses de nos vencer.
A selecção do pequeno principado, estado soberano, com uma superfície de apenas 160 quilómetros quadrados, afrontou e meteu medo à selecção das quinas. Empatar a duas bolas com o Liechtenstein é resultado neolítico, impensável e impossível, tanto mais quando na época neolítica a bola a existir prestava para tudo menos para jogar futebol. Mas os trinta mil habitantes do Principado puseram os 10 milhões de portugueses em sentido e mostraram ao mundo que o poder não é uma questão de números nem de grandes ou pequenos.
As desculpas que os derrotados arranjam para justificar a incapacidade de vencer tem muito a ver com este Liechtenstein que sem as mesmas armas que Portugal tem, chegou ao final da partida de 90 minutos em posição igual. Falei aos meus amigos que este Liechtenstein está aquém das capacidades que a Madeira dispõe e que teria que “roer muitos ossos” para conseguir roubar-nos um ponto.
Mas a verdade é que o Liechtenstein é um estado soberano, com direito a participar em todos os campeonatos desportivos da Europa e do mundo, tendo lugar cativo nas poltronas do poder europeu e mundial, e não se deixa intimidar nem condicionar pelos mais poderosos.
A comunidade internacional tem as suas regras e o que é para um é para todos. É como na política, as regras são iguais para todos e todos têm ao seu alcance a vitória. Os que perdem só podem ser vistos como menos capazes. Não se pense que os eleitores que votam num determinado partido são diferentes dos outros eleitores, a diferença está naquilo que cada um democraticamente escolhe, de livre e espontânea vontade. A política é um jogo, com regras iguais, vencendo quem melhor sabe interpretar as realidades sociais e mostra capacidade para fazer mais e melhor.
Se o Chipre, Malta, Liechtenstein, entre muitos outros territórios, são estados soberanos, porque razão não pode a Madeira seguir pelo mesmo caminho? O ser português é uma questão meramente circunstancial e a nacionalidade não é uma questão de “nascer assim e assim ter que viver” para toda a vida. Quantos novos países foram fundados a partir de outros estados soberanos. Atente-se ao que se está a passar nos novos países “nascidos” a partir do império soviético e que hoje integram a União Europeia, lado a lado com os países mais ricos e poderosos do velho continente.
Tenho dito que o futebol, inumeráveis vezes, põe uma região ou um país nos píncaros do mundo. Desfaz incertas, cria emoções, faz levantar multidões e dá alimento a um estado de alma indefinível. Quando em casa, sentado no sofá, de olhos postos na televisão, a não querer perder nenhum momento do Portugal-Rússia, deixando-me levar pelas fantásticas jogadas do nosso Cristiano Ronaldo, veio-me à memória a Madeira Região Europeia 2004, limitada a uma Autonomia condicionada à Constituição de Portugal.
Mas a emoção passou a ser mais intensa quando, a poucos minutos do fim, Cristiano Ronaldo cede o seu lugar a um colega, saindo das quatros linhas vibrantemente aplaudido pelos espectadores que prontamente começaram a entoar o nosso famoso “Bailinho da Madeira” que o imortalizado Max levou da ilha para o continente e nunca mais foi olvidado.
Aquele mágico som madeirense a ecoar pelos quatro cantos do estádio de Alvalade, em Lisboa, e a projectar sons perfeitamente audíveis através dos microfones das rádios e das televisões para todo o mundo, deixam qualquer ilhéu, a viver na ilha, a viver uma incomensurável emoção. Cristiano Ronaldo pôs os portugueses presentes num estádio de futebol da capital, todos de pé, a cantar o “Bailhinho da Madeira”. Marcou dois golos, fez as jogadas para outros dois golos e manteve sempre a inteligente humildade que é apanágio do madeirense.
Há coisas que nunca se esquecem e objectivos que nunca os madeirenses vão deixar de prosseguir até que a meta seja alcançada. Sinceramente, gostava de ver um Liechtenstein-Madeira a nível de selecções de futebol. Para ver se eles conseguiriam “roubar-nos” um ponto como fizeram a Portugal. Quero acreditar que a Madeira é bem mais poderosa que o Liechtenstein, em quase tudo!